terça-feira, setembro 29, 2009

III –Terras da Raia: síntese história da Cidade de Portalegre

Como terra portuguesa recebeu a sua carta foral das mãos de D.Afonso III em 1259. Uma década depois, por carta régia de 1271, D. Afonso III e sua mulher Dª Beatriz concederam a vila de Portalegre ao Infante D.Afonso Sanhes, assim como as vilas de Marvão e Arronches com todas os seus termos e privilégios. Seria durante o reinado de D.Dinis, que a vila pois em marcha uma serie de obras destinadas a fortificar este núcleo, no contexto de garantir a defesa da linha de fronteira, tal como ocorrera com a vila de Marvão, na mesma época. Em meados do século XVI o monarca D. João III reforçou a identidade administrativa de Portalegre quando elevou a vila a cidade, que graças a uma Bula Papal concedida em 18 de Agosto de 1549 por Paulo III se converteu em diocese. Nos fins da mesma centúria a aristocracia de Portalegre, se mostrava favorável à União Ibérica, de resto uma das mais importantes figuras da cidade foi um dos cinco governadores com mandato de Madrid, durante esse período histórico. Se tratava do Conde de Portalegre, D .João da Silva, que seria também pela mesma época Mordomo-Mor da Casa Real e Capitão Mor dos presídios e da gentes de armas. Nos inícios do século XVII as autoridades da cidade reclamavam junto da coroa espanhola a cobrança de pesados tributos que tanto prejudicavam a população. Todavia, o apoio à causa Ibérica era defendida com alguma determinação pela aristocracia portalegrense, através d, figuras como o Conde de Portalegre D. Diogo da Silva, sem dúvida um dos homens de confiança de Filipe IV para as questões militares das Índias; os Condes de Basto, Portalegre e Miranda, que eram chamados regularmente à Corte para consulta e opinião em matérias fiscais ou assuntos de natureza militar. Convém ressaltar que a economia de Portalegre se transformava de um modo significativo em finais do século XVII e nas primeiras décadas do século seguinte especializava-se na indústria manufactureira de fios e tecidos de lã. Ao mesmo tempo que a criação de cavalos continuava a ser uma actividade económica de referência no âmbito agrário desde os tempos da formação da nacionalidade portuguesa. No início do séc. XIX, como resultado da Guerra das Laranjas, as forças franco-espanholas pressionaram com êxito as praças e fortalezas do Alentejo, quando os estrategas das hostes nacionais imaginavam que o referido avanço ocorreria pelas Beiras. De facto, fruto da guerra, Portugal acabaria perdendo não só as cidades de Portalegre mas também outras populações fronteiriças como Castelo de Vide ou Campo Maior. Mas, pouco depois se restituía a dita cidade pelo Tratado de Badajoz, no qual a Espanha se comprometia a devolver as praças anteriormente conquistadas: Juromenha, Castelo Vide, Portalegre, Barbacena, Campo Maior e Ouguela. Por aquele tratado, os portugueses deviam cerrar os seus portos aos navios ingleses e procurar reunir todos os esforços conducentes a impedir a prática do contrabando que tanto prejuízo ocasionava aos interesses da economia espanhola. A diplomacia continuou a mover as influências no sentido de ultrapassar esta crise política, no entanto as populações civis da raia portuguesa e espanhola, continuaram a não se entender, não respeitando os limites entretanto gizados nas actividades de pasto, a documentação do Governo Civil refere várias situações conflituosas: “ … que nunca devem invadir ou ultrapassar de um só passo que seja, eles seus gados, para qualquer fim oposto à lei, à justiça e à atenção devida aos estrangeiros, os limites da mesma raia, quando estes forem conhecidos e se acharem bem fixados”.Após este período de convulsão e com o fim da guerra carlista e o início de um longo período de paz criaram-se as condições necessárias para o desenvolvimento das vias de comunicação a partir de e com destino ao núcleo urbano principal do norte alentejano, numa época que esta condição era determinante para o desenvolvimento económico e modernização social não só da cidade como do distrito.(Contínua)



segunda-feira, setembro 28, 2009

II-Terras da Raia de Portalegre: síntese histórica da Vila do Marvão



De volta à Raia de Portalegre, iniciamos hoje a síntese histórica dos principais centros transfronteiriços do Distrito. 1.1 - A Vila do Marvão: - se encontra situada na linha de fronteira, a pouco mais de 13 Kms., da antiga alfândega de Galegos, tendo a norte a vila portuguesa de Castelo Vide e a sudoeste a cidade de Portalegre. A vila de Marvão foi edificada numa elevação escarpada durante o período muçulmano, afirmando-se ao largo da sua história como uma fortaleza de guerra. Assim sucedeu, pelo menos desde o século IX, um século durante o qual este núcleo se transformou num espaço essencial como reduto defensivo, sendo utilizado com muita frequência como lugar e refúgio fortificado de Iban Marvuán, de quem a vila deve a sua denominação. A conquista do Marvão aos árabes, ocorreu graças ao avanço da reconquista cristã a sul e, mais concretamente, com a definição da chamada Linha do Tejo em 1147. Assim, pelo menos, desde 1167, que os cavaleiros dos Templários passaram a controlar este espaço, outorgando-se a sua carta foral em 1226 pelo monarca D. Sancho II e integrando o seu termo numa parte significativa no actual Distrito de Portalegre. Este facto demonstra o valor estratégico extraordinário deste núcleo raiano, uma vez que a dita carta foral estabelecia que uma terça parte dos seus cavaleiros devia permanecer de forma permanente na dita vila, não apenas com a missão de assegurar a presença cristã na dita vila mas como forma de mobilizar as forças cristãs para a conquista das terras do sul. Ao largo do período medieval o Marvão se afirmou como um núcleo importante no desenvolvimento económico da região do Alto Alentejo, uma vez que recebia uma parte considerável de produtos por via da vila mais importante do Tejo, Santarém, para distribuição das localidades mais próximas. Durante o século XIV a vila do Marvão foi fortemente abalada pela trágica e violenta, Peste Negra que levou o monarca D. Fernando a criar os chamados “coutos” para “hominizados” , que eram, indivíduos condenados por homicídio a quem a Coroa perdoava certos crimes ou faltas sempre que se fixavam em terras da raia. Se tratava, ao mesmo tempo, de defender o espaço raiano e contribuir para a estabilização da própria monarquia. E por isso podemos comprovar que foi o próprio rei Dom Fernando quem mandou reforçar através de várias obras da defesa do Castelo, pela soma de 3.000 reis brancos (ANTT, Carta Régia de 1443). Mais tarde, graças ao desenvolvimento do comércio externo, sobretudo com o reino de Espanha, a importância da villa do Marvão foi aumentando convertendo-se nos tempos modernos, não só um dos portos secos mais importantes do norte alentejano mas também como uma das praças comerciais mais representativas do Sul de Portugal, com períodos menos bons até meados do séc. XIX. Os séculos XIV e XV foram determinantes para a colonização do território, mas o apogeu demográfico teve lugar, provavelmente, no século XVI, quando entraram milhares de judeus pela fronteira fugindo à violência da Inquisição Espanhola. De todas as formas, a história mais conhecida de Marvão esteve marcada, sobretudo, por uma serie de eventos militares que a população viveu durante os séculos XVII, XVIII e XIX, entre eles destacaram as seguintes: - Guerra da Restauração – Inicialmente um cerco imposto pelas forças militares espanhola em 1641 e pouco depois em 1648, de um ataque lançado também por unidades militares hispânicas sob comando do Marquês de Lagañes; - Guerra de Sucessão Espanhola (1701-1715). Em 1704 a fortaleza foi tomada por um exército franco – espanhol dirigido pelo Duque de Berwick, ainda que no ano seguinte se restaurou a situação anterior por acção do exército português, comandado pelo Conde de São João. - Guerra Fantástica (1762-1763) – Ocorreu quando as forças espanholas fazendo uso de surpresa, tentaram uma vez mais tomar aquela praça de guerra sem êxito. – Guerra das Laranjas (1801). A praça seria uma vez mais atacada pelo exercito espanhol, sob direcção do Tenente Coronel D.Ramón Orrel. Mas, uma vez mais, as forças cercadas lograram em resistir com êxito ao assédio espanhol sob comando do Sargento Mor, João Miguel Silva, que tinha sido o responsável pela direcção das obras de fortificação de obras.- Guerras Peninsulares (1807-1811). Destacaram-se, as forças luso-espanholas quando através de um assalto, foram expulsas as forças francesas de ocupação durante a primeira invasão dirigida ao território português. Este assalto foi dirigido pelo Tenente Coronel espanhol D.Vicente Pérez e pelo Tenente Coronel luso, D. Pedro de Magalhães, um militar português que na sua retaguarda contava com o apoio de um corpo de voluntários formado em Valência de Alcântara. – Guerras Liberais (1832-1834. No início dos anos trinta de oitocentos, a vila do Marvão afirmou-se como um reduto defensivo liderado pelas tropas favoráveis ao absolutismo lideradas por D. Miguel, que apoiou alguns movimentos realizados pelos partidários do Infante D. Carlos Maria Isidro na Primeira Guerra Carlista ou Guerra dos Sete Anos. Em 12 de Dezembro de 1838 a praça seria tomada pelas forças liberais com ajuda, uma vez mais, das tropas espanholas. Poucos meses depois, na Primavera do ano seguinte, sofreu uma nova ofensiva das tropas absolutistas que, sem acabou por ser um insucesso por via dos territórios chegados por via espanhola. Em suma, a história da vila de Marvão esteve condicionada em toda a sua história pela sua situação geográfica e pela sua praça de guerra, protagonista de modo permanente desde as guerras da restauração até as guerras liberais na primeira metade de Oitocentos.

sábado, setembro 26, 2009

2.7 – Elvas Portuguesa: - Os grupos étnicos - religiosos e estrangeiros: Os Mouros

Os mouros e os judeus, estavam perfeitamente integradas na sociedade medieval, com os seus bairros próprios e com uma série de privilégios devidamente reconhecidos pela Coroa. Os mouros cuja presença era anterior à soberania portuguesa nunca tiveram o protagonismo dos Judeus que se fixam na vila e nos primeiros tempos da cidade elvense. Era um grupo mais heterogéneo do ponto vista social e económico, distinguindo-se na vida económica e científica de um modo particular nos séculos XV e XVI. A comunidade moura fixada no alfoz do espaço concelhio, encontra a sua origem no período anterior à Reconquista ou por outras palavras a presença muçulmana na “região histórica” de Elvas, foi contemporânea do processo de colonização do Al-Andaluz que se iniciou com a invasão da Península Ibérica em 711. Na verdade, a existência de comunidades muçulmanas e mourarias, deixaram registos arqueológicos ao longo dos tempos históricos, mas são mais objectivos e claros, na documentação medieval, nomeadamente a Sul do Tejo: Alcácer do Sal, Avis Évora, Elvas, Beja e Moura. Todavia, no longo percurso da história árabe no Ocidente, o espaço territorial da “região histórica de Elvas”, foi utilizado frequentemente pelos exércitos dos estrategas árabes, como foram os casos do malado, Ibn Marwan (874-889), sediado na Anaia (actual Marvão) nas suas incursões para Sul e Este da Península. Ou de Makhul outro malado, partidário de Marwan, documentado nas terras vizinhas da Juromenha, como governador e que em diversos momentos pôs cerco a Badajoz. Espaço estratégico para o domínio dos territórios do vale do Guadiana e das regiões de Badajoz e Mérida, nas mãos da dinastia dos Banu Harm desde 1026. Porém não podemos ignorar que Elvas, inexistente como cidade na época romana, foi provavelmente planeada por volta de 884 por Ibn Marwan, segundo o cronista árabe Ibn Al-Althir, que admite ainda antes da existência da conquista de Elvas, reconhecida na toponímia islâmica como Albas, Ilbas ou Yalbas, que no seu espaço territorial possuía uma fortificação incipiente de épocas mais recuadas, que Alexandre Herculano com todas as reservas que a historiografia positivista determina, denominou de "Castro Vitória". A maioria dos historiadores nacionais, defendem que a realidade da urbe elvense no período árabe, tratava-se de uma pequena cidade incapaz de competir com Badajoz, com cerca de 500 a 1000 habitantes segundo o consagrado medievalista Luís Kruss. A sua importância advinha da sua posição militar e económica, a Kura ou Kwar (cidade) de Elvas, para além das suas muralhas abrangia uma rede de atalaias, cuja finalidade era o controlo do espaço em redor como forma de assinalar a presença do inimigo. De resto estas atalaias no corredor militar entre Marvão e Badajoz estão na base dos sucessos e domínio militar imposto por Ibn Marwan nos finais do séc. IX. Nos tempos Medievais, os mouros residentes na vila portuguesa estavam perfeitamente integrados e a sua importância em termos demográficos não está documentada embora há referências bibliográficas no Archivo Municipal de Badajoz de vagas migratórias de mouros livres de Castela, Leão e da Estremadura em direcção às comunas do Alentejo. E a realidade documental prova esta hipótese, de facto, a presença extraordinária de efectivos mouros nos primeiros tempos da reconquista. Não é por acaso que os mouros livres da vila “contrataram” com D. Afonso III (ANTT, Liv. OA.Tit.,II, p.24 Vº), a construção de novas casas na vila. Vivia-se uma época em que os mouros gozavam de alguns privilégios com vista à sua integração social e só ligeiramente adversa durante o período da reconquista do Algarve, uma vez que a coroa Portuguesa receava a fixação moura naquela província do sul de Portugal. Duas décadas depois a comunidade moura florescia do ponto vista económico, embora não haja referência nas fontes documentais relativamente à aquisição de bens imobiliários, característica dos mouros abastados de Lisboa e Santarém, o ouro e a prata faziam parte do rol de bens quitados aos mouros da comuna elvense pelo monarca D. Dinis em 1284. Por outro lado, no interior da mouraria o grau de riqueza era diferenciado e perfeitamente identificado pelo número de indivíduos que constituíam a criadagem de alguns homens de negócio que constituíam a comuna de Elvas e de Vila Boim. Mas a maioria dos mouros tinham na agricultura a sua actividade principal nas terras próprias, aforadas ou de renda. Os albardeiros, sapateiros, pedreiros e outros mesteres ocupavam a vida profissional de uma parte deste grupo étnico que estava sujeita a pesados impostos, tais como: o imposto de capitação (nascimento); a dízima do trabalho, o imposto de compra e venda entre outros. As mourarias de Elvas e vila Boim eram governadas pelo alcaide dos mouros que desempenhava simultaneamente as funções de Juiz. (Continua).



quinta-feira, setembro 24, 2009

I - Terras da Raia do Distrito de Portalegre.

O espaço fronteiriço que será objecto do nosso estudo em alternância com as reflexões sobre “Elvas Portuguesa”, terá como finalidade divulgar a evolução histórica das cidades de Portalegre e Elvas e das vilas do Marvão, Arronches e Campo Maior, no período contemporâneo com algumas retrospectivas a outras épocas históricas.Em termos de espaço geográfico, trata-se de uma vasta região definida em termos de demarcação territorial pelo menos desde o século XIII, com algumas episódicas alterações. Estas populações fronteiriças, que evoluíram ao longo do tempo histórico, ocupam uma área espacial correspondente a cerca de 44% do espaço territorial do Alentejo e uma área aproximadamente de 441.0777 ha. do território nacional. Ao largo da sua trajectória histórica, estas populações se afirmaram como fundamentais para a defesa da soberania portuguesa, graças a uma rede de castelos que foram edificados e fortalecidos com obras de modernização ao longo dos tempos medievais e modernos. Por outro lado, desde meados do século XVI até há Época Contemporânea, a evolução histórica das populações do distrito portalegrense foram marcadas sempre por realidades administrativas diferenciadas e por uma evolução económica distinta. De facto, Elvas (em 1513) e Portalegre (em 1550) foram elevadas à categoria administrativa de cidades, enquanto as vilas de Marvão (1226), Arronches (1255) e Campo Maior (1229) continuaram na mesma categoria administrativa e em dependência directa, por razões políticas e sociais, das cidades mencionadas pelo menos até ao início do Estado Novo. Do ponto vista económico, a agricultura constituiu a base económica do distrito de Portalegre, com excepção das cidades de Portalegre e Elvas. A primeira, capital do distrito e em conflito permanente com a cidade de Elvas a partir de meados do séc. XIX por razões de liderança administrativa , na vida económica afirmava-se como o núcleo industrial mais importante do distrito, realidade de resto válida, pelo menos desde meados do séc. XVII. A segunda, Elvas, considerada como uma das praças militares de referência do Reino, desde a época da Regeneração, [ainda que a presença efectiva e permanente de forças militares de carreira seja uma realidade de meados do séc. XIX], quando na mesma época a cidade raiana se afirma como o “ centro comercial ” mais importante do distrito em função das facilidades comerciais que a economia transfronteiriça favorecia numa época em que o caminho-de-ferro, a Linha de Leste chegava a Badajoz. No caso das populações das vilas de Marvão, Arronches e Campo Maior, seguiram a sua trajectória histórica com base na exploração directa das riquezas geradas pela terra, em particular de uns bens rústicos que pertenciam a um grupo restrito de proprietários exteriores a estes municípios e que na sua maioria, se identificavam com algumas casas aristocráticas. Apesar de algumas alterações na geografia das propriedades destas localidades depois da Revolução Liberal e das Reformas Legislativas que então ocorreram. E que permitiram a ascensão de alguns novos proprietários residentes nos centros urbanos e que então disputavam a aquisição das antigas terras senhoriais da aristocracia portuguesa. De facto nas últimas décadas de Novecentos, algumas herdades de Marvão se encontravam sob domínio de alguns proprietários e industriais da cidade Portalegre. O mesmo se verificava com as melhores terras de Campo Maior, disputadas pelos grandes proprietários de Elvas, muitos deles até há pouco tempo registados na documentação como rendeiros. Mais singular era a realidade da vila de Arronches, cuja demarcação das terras de melhor qualidade, dedicadas há exploração da plantação de olival, se repartiam, entre as diversas famílias de Elvas e Portalegre, ainda que algumas surgem na documentação registadas como património de algumas ordens religiosas. ( Continua)

domingo, setembro 20, 2009

2.6 - Elvas Portuguesa: - Os mercadores a sua ascensão profissional e económica

Os comerciantes ou mais exactamente os mercadores, ao longo dos séculos XIV e XV foram se afirmando como um estrato social com capacidade económica de tal forma que alguns deles chegaram a ter loja na capital do reino, como os Fernandes e os Gomes. Na sua grande maioria eram cristãos novos ou judeus, que em pouco tempo mereceram algum reconhecimento no comércio regional na qualidade de almocreves, beneficiados pela isenção do imposto de “Aduana” que penalizava os seus concorrentes castelhanos obrigados ao pagamento desse direito. Como podemos comprovar pela análise das fontes que referem que os homens de fora, pagam tributo sobre as mercadorias: “aquelas que hajam de trazer para aí vender” ou “as cousas que os homens de fora comprarem para levarem para fora do dito termo “. Mas depressa os tendeiros da praça comercial da vila de Elvas se fizeram ao caminho como almocreves e depois, já como mercadores acabaram por fazer fortuna na raia do distrito de Portalegre ao longo das primeiras décadas de quatrocentos numa época em que os produtos de origem colonial, estavam longe de concorrer com produtos oriundos do mundo rural, como os cereais e os gados frequentemente utilizados na prática do contrabando. O exemplo mais significativo do percurso dos tendeiros da vila de Elvas foi sem dúvida o caso de Diogo Álvares Soriano (ANTT, Inquisição de Évora, Manuscritos de Livraria, nº771), que residia na Rua da Carreira dos Cavalos, inicialmente tendeiro e mais tarde, mercador de largo trato e que se especializou como mercador de panos da Índia. Correndo as feiras de Lisboa, Flor do Crato, Vila Viçosa e Elvas e com uma rede de distribuição de longo curso em território castelhano, assegurada pelos seus familiares a partir de Badajoz até Málaga. Os registos documentais associam à sua actividade mercantil a de prestamista financiando outros mercadores elvenses, como os cristãos novos, Pero Vasquez e Álvaro Fernandes, residentes em Elvas (ANTT, ob.cit.nº 1044). Todavia nas rotas comerciais de vizinhança, no sentido de Elvas e Badajoz e vice-versa, estavam na mão dos almocreves tal como no comércio regional a norte do distrito de Portalegre, Pedro Álvares, conhecido azeiteiro da vila, costumava vender sardinhas em Badajoz e azeite em Albuquerque (ANTT, ob.cit nº10440). Nos finais do séc. XIV, o mercador independente da sua origem e nacionalidade em pouco tempo conquistou com o seu trabalho de utilidade pública, a estima social e a tolerância da igreja que então condenava a usura e o pecado da avareza em terras luso-castelhanas pelo menos antes da perseguição a que a Inquisição sujeitou os judeus e cristãos novos. De Elvas para a capital, deslocavam-se António Fernandes, neto de António Fernandes que chegou a ser tesoureiro de D. Manuel e que por laços familiares se ligou a outras famílias de poderosos homens de negócios entre elas, Manuel Gomes de Elvas que tinha residência, na Rua de Nossa Senhora da Vitória (Lisboa) e que foi primeiro mercador da nova cidade de Elvas no trato do comércio colonial nas primeiras centúrias da época Moderna. Mas o período medieval fica marcado pela persistência de uma geração de mercadores que aproveitando a situação estratégica da vila raiana cedo se distinguiram nos mercados locais e nas rotas regionais, sendo reconhecidos pela comunidade local como homens possuidores de “cabedal” (Continua).

segunda-feira, setembro 14, 2009

2.5. -Elvas Portuguesa: O 3ºEstado o caso dos Mesteirais

O 3º Estado englobava a maior parte sociedade medieval que na vila de Elvas, incluía entre eles os rendeiros, mesteirais e comerciantes, como os “grupos sociais” com maior condição de posse e de privilégios durante os séculos XIII e XV. Os rendeiros eram uma espécie de campesinato livre que exercia a sua actividade nas terras reguengas e de outros senhores do concelho (laicos ou eclesiásticos). Os foros e as rendas, estabeleciam o contrato entre o senhor e o rendeiro, quase sempre anual, no caso particular das rendas reais. Nos tempos medievais, a documentação regista o pagamento de um quinto do pão, vinho e outras novidades. A excepção era o azeite que pagava um quarto. O rol das propriedades da Coroa a quem os rendeiros pagavam taxa no termo de Elvas, eram não só as hortas, vinhas, ferragiais e olivais, mas outro tipo de propriedades como casas ou instalações domésticas como moinhos e lagares. De resto alguns direitos como a cobrança de portagem, foi exercida pontualmente por alguns rendeiros que pagavam foro pelo exercício de esse serviço de nomeação régia e exercido quase sempre pelos oficiais de portagem [ANTT - Chancelaria de D.Afonso V.]. Os mesteirais e os comerciantes, numa época que o fundamental era antes de tudo, sobreviver, o trabalho era um bem necessário. O seu papel na economia da vila raiana é indiscutível na medida em que estes dois grupos procuravam responder às necessidades vitais. E que no caso dos mesteirais, proprietários das oficinas-tendas que se erguiam nas freguesias de maior importância na economia local, a da Alcaçova e do Salvador. O grupo profissional dos mesteirais, foi sem dúvida o que mais se cresceu até aos inícios do séc. XVI, não faltavam os curtidores, peliceiros ou peliteiros, que trabalhavam as peles e asseguram o vestuário a uma população em nítida em expansão. (Armando Castro, Ob.cit. p.195). Os ferreiros que trabalhavam o ferro “maçudo” ou moído ou moludo em barra, os latoeiros que asseguravam entre outros artefactos, os objectos trabalhados em latão, cobre e o estanho. Os oleiros que desde a fundação da vila de Elvas estavam isentos do pagamento de portagem, relativamente à obtenção da matéria primas, mas não relativamente à louça vidrada ou de barro. A importância dos sapateiros era indiscutível na confecção da “calcadura” de pele e de couros e na carta foral, havia mesmo um capítulo especial relativamente ao desempenho desta função. Os marceneiros asseguravam a loiça de madeira, as arcas, tonéis e outro tipo de recipientes utilizados no quotidiano medieval. O mesteiral por via e regra, era vendedor do seu produto e esta comercialização ocorria no espaço “oficinal”. Por outro lado, não devemos de esquecer o papel do ferreiro, sapateiro e do peliteiro, fundamentais na equipagem de guerreira numa vila de fronteira, como a ferradura e as peças metálicas para cavalos e cavaleiros, a protecção dos pés da peonagem ou os arreios dos cavalos. Na “produção” da utilisagem agrícola, o ferreiro destacava-se dos demais pela importância económica da actividade agrícola que envolvia a maior parte da população. (Continua).




quarta-feira, setembro 09, 2009

2.4. Elvas Portuguesa.A aristocracia vilão e os escudeiros.

Convém salientar que uma parte significativa da nova aristocracia que se desenvolve nos séculos, XIV e XV, tem a sua origem num estrato social que nos primeiros tempos da reconquista vivia entre o arado e a espada face ao inimigo, que com regularidade efectuava as suas “incursões” na chamada guerra guerreada. Nascia neste quadro não institucional uma aristocracia vilã que ao longo do séc. XIII assumiu e pautou-se pelos valores da honra que eram apanágio da nobreza. Ao mesmo tempo que se foi diferenciado de uma vasta população desprovida de posse, que ao serviço da Coroa foi obtendo algumas mercês que lhe permitiram dispor de meios suficientes para o sustento de um cavalo, a compra e manutenção de armas e em alguns, poucos, tinham já um pequeno grupo de servos ou criadagem ao seu serviço. Os Gante e os Garro, não só integraram as milícias concelhias como serviram a tempo inteiro o monarca e as doações régias que foram feitas a estas primeiras famílias da cavalaria que durante semanas serviram no fossado e como tal, eram recompensados com frequentes doações régias. Por vezes o casamento, entre os vários membros da cavalaria permitiu o “nascimento” de uma cavalaria vilã que no séc. XIV se distinguia já com valores sociais e de honra que eram apanágio da nobreza, todavia no presente momento do nosso conhecimento sobre as fontes medievais e nomeadamente a vasta documentação das Chancelarias Reais, não nos permite ainda de ter uma visão clara e objectiva, sobre a origem de muitos cavaleiros da vila de Elvas. Todavia o seu número no nas primeiras décadas do século XV era já significativo uma vez que o privilegiado e cavaleiro, por nomeação régia em 1439, Álvaro de Abreu, era designado vedor dos vassalos do rei, dezassete anos depois [ ANTT, Chanc. D.Afonso V., fol. 13 e segº ] e a sua importância social equiparava-se já desde os tempos da reconquista ao Infanção da nobreza de topo [ Leyes, I,p.47], ganhando um estatuto de privilegiado nas terras da raia . Os escudeiros, o estrato base da “pirâmide” social da aristocracia medieval português, se identificavam na vila de Elvas com a Casa Senhorial D.Henrique, que incluía desde 1321 uma Comenda onde a Ordem de Cristo, que detinha vários bens imóveis e estava incluía ainda na rota da criação do gado lanígero que se deslocava da Beira Henriquina, num percurso onde as localidades de Montalvão e Elvas eram os pontos de apoio no Alto Alentejo na ida a Castela [ ANTT, Ob.cit, fl.38V º]. O número de escudeiros da Vila de Elvas na Casa Senhorial do Infante do Henrique é deveras significativo quando se compara com as nomeações dos funcionários ao serviço do “Navegador”: Afonso Domingues, Besteiro do Couto, 1448 (Ob.cit.fol.27); Afonso Gonçalves, Besteiro do Couto ( Ob.cit., fol.71 Vº ); João Rodrigues Trigueiro, servidor da Casa do Infante e Escrivão do Porto de Elvas (Alfândega 1436) (Ob.cit. fol.36.). Outros escudeiros de renome da Casa do Infante foram sem dúvida: o navegador Álvaro Tristão e seu irmão Nuno Tristão navegadores da Ordem de Cristo, que descobriu várias paragens da Costa Ocidental africana, fixando o reconhecimento da referida costa em Cabo Branco. Lourenço de Elvas – navegador capitão ao serviço de Gil Eanes. Estevão Subtil – Escudeiro do Infante e Gil Fernantes distinto descendente do herói mítico de Elvas com o mesmo nome e que foi Chanceler da Correição da Comarca Entre Tejo e Guadiana. Em Elvas o estatuto do escudeiro praticamente não é mencionado na documentação o que se entende numa terra onde o grande senhor era o rei e como tal deviam servir a casa real nos tempos difíceis que a guerra determinava, contudo no séc. XV eram na sua maioria funcionários da administração régia, de ordens militares religiosas ou casas senhorias como a de D. Infante D. Henrique. Por outro lado, esse papel foi sempre assumido pela cavalaria vilã cujas hostes jamais foram significativas e por outro lado, a ascensão de escudeiro a privilegiado foi uma prática usual reduzindo a persistência de homens não nobres na baixa nobreza. Por fim, há que ter presente que a Nobreza em Elvas, nunca se afirmou no período medieval como um grupo nobiliárquico forte e as linhagens de Estevão Anes e dos Aboim, acabaram mesmo por se extinguir e em parte devido a política centralista de D. Afonso III que acabou por favorecer a constituição de uma nova linhagem constituída por bastardos régios. Por último, a verdade é que o rei era o único senhor feudal e a força, para exigir a uma multidão de vassalos a que exigia fidelidade, terras, “contias” e até as suas próprias não só para a defesa da soberania, mas inclusive para os dominar.

domingo, setembro 06, 2009

2.3- Elvas Portuguesa o alargamento da aristocracia local.

Durante o séc. XIV, os Annes e os Pegado, surgem como doadores à maneira senhorial, os primeiros com ligação à Corte, beneficiam frequentemente a Igreja com doações de bens materiais, Esteve Annes foi um dos senhores locais que mais beneficiou a primitiva igreja de Elvas como fonte espiritual das primeiras comunidades locais. O rol de bens segundo a documentação se inscreve em terras de olival e de vinha, mas também em moradas de casas que em meados do séc. XIV beneficiava a Igreja do Salvador através do testamento passado por Lourenço Annes. (ANTT, Liv 1- AV,1353, p.76. ) .Os Barbudo, desenvolvem-se durante a época quatrocentista e parte da sua riqueza fundiária, localiza-se em Barbacena na qual a referida família cobrava de foro no valor de 120 rs. à comunidade local que explorava a Herdade da Colina, durante a regência do infante D. Pedro e por testamento (ob.cit. 77), tal património fundiário foi legado à Igreja de Alcaçova, numa época em que as doações entre aristocratas e clérigos era frequente. Em meados do séc. XV a fidalguia de Elvas cruzava-se com o funcionalismo, Affonso de Aboim era um dos procuradores às Cortes e foram várias as respostas dadas pela Chancelaria Real, na época de D. Pedro, a este aristocrata. Joanne Mendes de Vasconcellos outra figura da nobreza local em ascensão foi Corregedor da Comarca Entre-Tejo e Guadiana e substituto de Gil Fernandes quando este desempenhou o cargo de chanceler da correição (Corpus Codicum,Vol.1, p.147). Como escolar em leis as suas informações legislativas eram ouvidas na corte como podemos comprovar por várias carta régias dirigida a João Mendes entre elas a de 23 de Dezembro de 1435 “Os dinheiros que o marinho há d´aver E de que lugares E de que pessoas” (ANTT, Ordenações de D.Duarte, p.640). Doações da propriedade régia a João Mendes em Elvas encontramos um aforamento que “el rrey o mandou per Johane mmendez Corregedor de sua Corte”.(Canc. D.Duarte, Tomo 2, p. 425-426). A fidalguia de sangue em meados do séc. XIV, os ricos homens oriundos da Corte, recebiam no seu seio os novos membros nascidos em terras raianas e que livres por nascimento procuraram servir o monarca na guerra e nas funções da administração que o estado centralizado determinava. A nobreza mais humilde, os cavaleiros foram também objecto de benefício de doações régias e em especial na época de D. Afonso V como são os casos de Pedro Aires (1148), de Vasco da Gama ou de Manuel Pessanha ou Manuel Pessegano (1472) que recebe a Herdade do Cabedal por carta régia de 23 de Janeiro, cavaleiro da Casa do Infante D. Henrique acabaria por se distinguir como cartógrafo. Todavia a cavalaria era já uma força considerável no senhorio da coroa na vila de Elvas, como se admite por uma leitura atenta de um ofício da Chancelaria Régia, datado de 7 de Novembro de 1470 que pretende indagar o número de armas distribuídas aos vassalos do rei e entre eles os escudeiros da Ordem de Cristo que na sua maioria pertencia a Casa do Infante D.Henrique representada na vila de Elvas com bens imóveis documentados desde 1321 e confirmados em 1326.(Continua)

quarta-feira, setembro 02, 2009

2.2-Elvas Portuguesa: a fidalguia em formação.

A primeira Nobreza com raízes no período medieval, radicada e nascida na Vila de Elvas, afirmou-se sobretudo nos séculos XIV e XV, incluindo vários graus da mesma, os ricos homens e a uma baixa nobreza que incluía a cavalaria e os escudeiros. Entre elas destacamos algumas : Os Gante, provavelmente de origem castelhana e radicada em Elvas no início do séc. XV e que se integrava na nova nobreza da Corte de Avis, uma vez que Vasco Peres Gante, cabeça da família e que serviu as armas de Portugal como cavaleiro, era escudeiro e vassalo da Corte. Entre Vasco Peres Gante, nascido em Elvas e Pêro Rodrigues Gante, seu sobrinho decorre quase um século e a integração da mesma família na aristocracia de Corte. Quando Pêro Rodrigues Gante, recebe por carta régia de D. Afonso V,(ANTT, 1454) as armas da família. São elas: de vermelho, um arco “turqueso” cosido de verde, posto em pala e encorado de prata, ladeado de dois grumes de prata. Timbre: um braço de vermelho, picado de ouro, em banda e empunhando o arco do escudo. Os Garro, devem a sua ascensão à Nobreza de Portugal, pelo serviços prestados nas guerras com Castela durante a crise geral do séc. XIV, a origem mais remota da família encontra-se em Pedro Esteves Garro, mas é o seu filho o escudeiro do mesmo nome Pedro Esteves Garro que daria nobreza à família, ao serviço do Mestre de Avis, o seu filho Pedro Afonso Garro, também escudeiro fez parte da hoste que participou na tomada ou conquista de Ceuta em 1915, mas é o escudeiro Numo Martins Garro, a quem D. Afonso V, lhe dá a condição de fidalgo por todos os serviços que prestou à Coroa na Guerra de Castela e nas praças marroquinos, por carta régia de 1475 (ANTT, 1475). O seu escudo apresenta como armas um escudo de vermelho, comum leão de prata empunhando nas garras uma bandeira bifurcada de verde, hasteada de ouro e carregada de uma flor de Lis do mesmo, e por timbre o leão do escudo. No âmbio dos primeiros ricos homens da vila destaca-se os Pegado, na pessoa de Estevão Martins de Pegado, que instituiu o primeiro vínculo na cidade de Elvas e que tinha como armas da fidalguia, três flechas de prata, com hastes de ouro e empenadas de vermelho, enfaixadas e atadas do mesmo, as pontas para cima. Na primeira geração da elite aristocrática da vila de Elvas, destaca-se os Zembrana ou Zembrano, da fidalguia andaluza, fiel partidário de D. Joana, legítima rainha de Castela e que se fixou após a Batalha do Toro na vila raiana por permissão de D. Afonso V. Fernão Gonçalves de Sousa era o rico - homem mais da raia de Portalegre foi inclusivamente o alcaide do Castelo de Olivença e pelos serviços prestados a D. Fernando recebeu a Vila de Aboim que teria voltado aos bens da Coroa com todos os seus direitos, rendas e jurisdição (ANNT, Chanc. de D. Fernando, Livro U, fols, 122-149 ). Nesta primeira etapa da formação da aristocracia elvense, os ricos homens ocupavam os ofícios mores da administração local e detinham os poderes militares e neste caso encontramos as quase três dezenas dos alcaides de Elvas, cujo poder económico advinda de uma parte das receitas e multas pagas pelos moradores da vila. (continua)