quarta-feira, dezembro 21, 2011

1.1.1.O renascimento militar da Praça Militar de Elvas numa conjuntura de guerra….


Os campos agrícolas da raia de Elvas afirmaram-se espaços de exílios para
os extremenhos que passavam a raia.


A aviação germânica que participou na batalha área de Badajoz fez escala numa herdade elvense.

Os arredores em torno do Forte de Santa Luzia faziam parte da rota dos exilados em fuga da violência e da morte que marcava os dias em Badajoz ... 

Os franquistas contaram com a colaboração das autoridades portuguesas na detenção da oposição republicana....

Nos primeiros tempos de vigência do Estado Novo, as suas estruturas de suporte foram crescendo com o seu próprio aparelho burocrático, a censura e a vigilância marcaram necessariamente muitos momentos da vida quotidiana da cidade de Elvas e de um modo particular pela situação estratégica de espaço fronteiriço. Se a nível da vida local, as dificuldades de afirmação de uma acção política favorável ao exercício do poder local foi uma constante pelo menos até meados do séc. XX , a verdade é que a conjuntura de guerra que se viveu no Ocidente  não facilitava qualquer solidariedade com os poderes locais. Mas ao contrário, do que se tinha verificado durante a I República a cidade de Elvas, voltava a ganhar o seu estatuto histórico que tinha “ganho” durante as guerras peninsulares voltando a ser uma praça militarizada, uma placa estacionamento. Ou seja a Guerra Civil de Espanha e em consequência indirecta a 2ºGuerra Mundial, voltava a dar dignidade ao estatuto militar da velha praça militar da época Moderna, praticamente desmilitarizada entre finais da Monarquia Constitucional e a I República. A guerra Civil de Espanha seria o primeiro momento de afirmação, a cidade elvense no Inverno de 1939 tinha se transformado no “centro do mundo”, políticos, jornalistas e equipamentos militares permaneciam instalados nas artérias e nas proximidades de Elvas com ligação à fronteira, descrições da época demonstram esse intenso movimento como a coluna de apoio á causa nacionalista (franquista): “A coluna automóvel do Rádio Clube Português, que na sua longa viagem de Lisboa-Badajoz, transportava donativos em géneros e agasalhos medicamentos. As camionetas alinhadas por distritos e levando à frente o de Lisboa, estendiam-se por quilómetros. Esperava-se ansiosamente a entrada em Espanha. Faziam-se perguntas contínuas aos chefes das colunas distritais e o tempo ia passando. Havia talvez uma hora que ali estávamos quando de Elvas nos chegou o barulho de potentes aviões. Os olhos perscrutaram o espaço ansiosamente até que se descortinavam três aviões que para nós se dirigiam. Eram aviões portugueses das nossas forças aéreas que sobrevoaram as colunas num voo elegantíssimo que despertou o mais vivo entusiasmo. Vivas estridentes ecoaram, pelo espaço numa expontânea de fé nacionalistas, braços bem alto para o céu, em direcção às cruzes de Cristo rubras, que se avistaram na fuselagem dos aparelhos”. O Coronel Passos e Sousa, natural de Elvas, Ministro da Guerra em 1934-1936, era designado pelo regime para assumir o comando da Praça face a qualquer ameaça republicana que eventualmente pudesse ameaçar a soberania nacional face à ameaça de uma vitória republicana em Espanha. O tempo em Elvas parara com a tragédia espanhola, a solidariedade não era palavra vã, as notícias corriam em toda a raia: “As senhoras de Elvas e campo Maior, que tanto carinho e dedicação confeccionaram agasalhos para as tropas que estão batendo na “frente” pede-nos o Consulado de Espanha, nesta cidade que o tomemos público o seu profundo e fervoroso reconhecimento para notável iniciativa”. Nas herdades junto ao Guadiana, os actos de bravura e de humanidade dos proprietários das casas agrícolas elvenses sucediam-se: “O Dr. José Albarran atravessou o rio a nado, seguido de perto de comunistas. A perseguição foi tão feroz que o nosso hóspede chegou aqui em lamentável Estado, não havendo água que o saciasse”. Todavia, um pouco por todo o lado, passavam a salto, homens, mulheres e crianças, independentemente da sua posição política face às facções em conflito, as crianças muitas vezes passavam a raia sob protecção de contrabandistas elvenses e campomaiorenses, sendo depois enviadas para o norte de Portugal, antes de partirem para a América Latina, por via marítima. Mas, sem dúvida que com muitos riscos correram vários homens e famílias de Elvas, que protegeram as centenas de refugiados republicanos espanhóis, que atravessaram a raia. Uma vez que desde finais de Outono de 1936, o Governador Civil de Portalegre e os militares estacionados em Elvas e Badajoz, para além do director da Polícia Internacional de Segurança Pública, tinham ordens para deter e barrar a entrada de qualquer indivíduo identificado com a causa republicana. As detenções entretanto sucediam-se como se lê em documentos rubricados por secreto: “Alguns comunistas fugiram para Portugal, onde foram presos pelas nossas forças de fronteira”. Numa atitude informativa, o Prof.Dr. Vicent Gray, da Universidade de Valhadolid, dava a conhecer aos Elvenses: “A Espanha luta contra o comunismo, e ao denunciar o seu sangue, o mais precioso, o da sua juventude, que renunciou aos amores e à prosperidade e a força do amanhã …”.  Neste teatro de guerra, em que muitos elvenses subiam aos montes para assistir aos bombardeamentos da aviação franquista e germânica sobre a cidade de Badajoz, na cidade de Elvas, Ventura Abrantes defendia que Portugal tinha uma oportunidade única para recuperar Olivença, em 20 de Fevereiro de 1938, declarava que “um grande número de patriotas vão empreender uma ofensiva patriótica “… mas o jornal nacionalista a Defesa, no seu editorial dava conta das pretensões de Ventura Abrantes e denunciava: “Reclamar Olivença nesta altura pode ser um disfarce e neste momento histórico que atravessamos é fazer propaganda dos vermelhos”…. Mas com o fim da Guerra Civil de Espanha ainda com as feridas por sarar na raia luso-espanhola, o elvense Manuel Cayola, no Correio Elvense, previa o desencadear de um conflito à escala mundial:”A Espanha entrou no Eixo das grandes potências totalitárias, a Itália absorveu a Albânia e a Inglaterra, na direcção da linha defensiva da Europa atribulada, decretou o serviço militar” e alguns meses depois, o jovem promissor das letras elvenses Eurico Gama, escrevia: “Assim alastra, como um incêndio tremendo e devastador, pelo mundo inteiro, não poupando crianças, nem mulheres, nem velhos, metralhando e reduzindo a pó, hospitais, misericórdias, asilos  e maternidades, bombardeando escolas e templos ….” ….a guerra na Europa estava no seu início. Em Elvas a vida marcava, passo, a pobreza e a modéstia, fazia parte do homem comum perante a inoperância do poder local, limitado pelo centralismo e pela ordem militar numa época de racionamento e de austeridade económica, que se manifestou durante quase  duas décadas, 1930 e 1940 …..  Em Elvas vivia-se em paz mas numa conjuntura de prevenção que acabou por tornar contribuir para a sua importância militar quase até final do século XX como espaço de estacionamento militar para conflitos armados a longa distância.